sábado, 14 de junho de 2008

ciçô


Os movimentos oscilatórios da Humanidade são de sempre. Povos, culturas e países estiveram na mó de cima, mas tão depressa cairam na mó de baixo. Tão depressa em termos cósmicos, porque as mós duravam várias centenas de anos.
Mas assim foi com a China, Índia, Japão, Grécia, Roma, e depois a Europa na sua totalidade.

Há um salto qualitativo quando se fala da Europa, sobretudo depois de 1500. O desenvolvimento da liberdade (de ideias, de circulação de pessoas, de ideologias) permitiu que, mesmo com regimes totalitários ou perseguições religiosas e tribunais inquisitoriais, os artistas, banqueiros, escritores e pensadores pudessem estabelecer-se aqui e ali, não sendo castrados na sua função dinamizadora da sociedade - o caso de Gutemberg é paradigmático porque revelador: as artes tipográficas já tinham sido descobertas na China, mas o sistema fechado nunca permitiu a sua universalização. Gutemberg conseguiu estabelecer-se numa cidade onde a liberdade de pensamento e de execução de ideias facilitou um dos inventos mais revolucionários do tempo. Lutero não poderia ter dado seguimento ao seu projecto de alfabetização através da Bíblia, se não fosse Gutemberg, e por aí fora.

Isto para dizer o quê? Que há uma diferença, sempre houve, muito grande entre o chamado Ocidente e o Oriente, mesmo que posto isto de uma maneira muito simplista. E essa diferença também teve uma expressão major na organização das sociedades, dos sistemas políticos, na liberdade e democracia, no bem estar e no welfare state.

A abundância e conforto dos países europeus que vivem ou viveram sob governos social-democratas, liberais ou conservadores, só foi possível porque o resto do mundo estava ainda em estado semi-vegetativo. O conforto de uns sempre se fez à custa do mal-estar e da exploração de outros.

O que vemos agora, é o emergir da necessidade e do desejo de "melhor estar" em países tão imensos como a China ou a Índia. Ou mesmo África, pese embora as cleptocracias e as ditaduras. O chamado mundo Ocidental olha, perplexo, para isto e não compreende.

Não compreende, sobretudo, que nada voltará a ser como era dantes, porque os cidadãos de segunda já não o querem ser, mesmo que ainda sejam apenas de "primeira e meia" - a nossa sobrevivência passará, creio, enquanto sociedade de valores, por um enorme exercício de humildade, contenção, refrear do consumismo e (re)descoberta de espaços, actividades e confortos naturais, simples, gratuitos e dirigidos ao Homem, enquanto pessoa frágil mas de pensamento estratégico sonhador, altruísta e de longo prazo.

Se voltarmos a ser humanos aguentaremos os choques petrolíferos. Se quisermos prosseguir no caminho que tem como objectivo sermos deuses, a queda vai ser brutal.

Pediatricamente falando, ou nos tornamos adultos e responsáveis, ou persistimos nas birras e na omnipotência dos 18 meses...

1 comentário:

miguel disse...

Subscrevo o texto na sua quase totalidade.A globalização anda a tirar milhões da pobreza, facto que me deixa, pessoalmente, muito satisfeito.

Claro, a globalização nunca seria possível sem o ocidente,o seu "know-how" e as suas liberdades, que têm vindo a ser construídos, como dizes, há 500 anos.

Pesoalmente, também, estou disposto a abdicar de algum conforto ( aliás, abdicação essa que está em curso) para que o conhecimento e a riqueza alastrem planeta fora.

Espero, no entanto, que os países que agora usufruem da globalização, empreendam também um esforço de convergência com os valores , a lei e a democracia deste tão invejado e mal compreendido ocidente, que , por acaso e felizmente, é a minha casa, aquela onde me sinto bem.

Se assim acontecer, bendita globalização.