sábado, 9 de agosto de 2008

Ficam nos "comentários", quatro letras de músicas sobre Dom Sebastião, de quem falámos há dias - Sérgio Godinho, José Cid, José Mário Branco e Nhá Jansa

4 comentários:

Mário disse...

SÉRGIO GODINHO
Os demónios de Alcácer-Quibir


O D. Sebastião foi para Alcácer Quibir
de lança na mão, a investir, a investir,
com o cavalo atulhado de livros de história
e guitarras de fado para cantar vitória.

O D. Sebastião já tinha hipotecado
toda a nação por dez reis de mel coado
para comprar soldados, lanças, armaduras,
para comprar o V das vitórias futuras.

O D. Sebastião era um belo pedante
foi mandar vir para uma terra distante
pôs-se a discursar: isto aqui é só meu
vamos lá trabalhar que quem manda sou eu.

Mas o mouro é que conhecia o deserto
de trás para diante e de longe e de perto
o mouro é que sabia que o deserto queima e abrasa
o mouro é que jogava em casa.

E o D. Sebastião levou tantas na pinha
que ao voltar cá encontrou a vizinha
espanhola sentada na cama, deitada no trono
e o país mudado de dono.

E o D. Sebastião acabou na moirama
um bebé chorão sem regaço nem mama
a beber, a contar tim por tim tim
a explicar, a morrer, sim, mas devagar

E apanhou tal dose do tal nevoeiro
que a tuberculose o mandou para o galheiro
fez-se um funeral com princesas e reis
e etcetera e tal, Viva Portugal.

JOSÉ CID
A Lenda D'el Rei D. Sebastião


Fugiu de Alcácer Quibir
El Rei D. Sebastião
Perdeu-se num labirinto
Com seu cavalo real

As bruxas e adivinhos
Nas altas serras beirãs
Juravam que nas manhãs
De cerrado de Nevoeiro
Vinha D. Sebastião

Pastoras e trovadores
Das regiões litorais
Afirmaram terem visto
Perdido entre os pinhais
El Rei D. Sebastião

Ciganos vindos de longe
Falcatos desconhecidos
Tentando iludir o povo
Afirmaram serem eles
El Rei D. Sebastião
E que voltava de novo

Todos foram desmentidos
Condenados às gales
Pois nas praias dos Algarves
Trazidos pelas marés
Encontraram o cavalo
Farrapos do seu gibão
Pedaços de nevoeiro
A espada e o coração
de El Rei D. Sebastião

Fugiu de Alcácer Quibir
El Rei Rei D. Sebastião
E uma lenda nasceu
Entre a bruma do passado
Chamam-lhe o desejado
Pois que nunca mais voltou
El Rei D. Sebastião
El Rei D. Sebastião


JOSÉ MÁRIO BRANCO
Caminheiro


Onde vais ó caminheiro
Com o teu passo apressado
Onde vais ó caminheiro
Com o teu passo apressado
Vou ao cais do terreiro
Ver o rei Sebastião primeiro
Num lençol amortalhado
Voltou no seu veleiro
No nevoeiro
Sem leme nem gageiro
E com o casco arrebentado
Onde vais ó caminheiro
Com o teu passo apressado
Com teus olhos em braseiro
E teu rosto afogueado
Vou ao cais do terreiro
Ver o rei Sebastião primeiro
Por alcunha a desejado
Voltou no seu veleiro
No nevoeiro
Sem leme nem gageiro
Num lençol amortalhado
Onde vais ó caminheiro
Com o teu passo apressado
Porque levas caminheiro
tanta pressa no cajado
Vou ao cais do terreiro
Ver o rei Sebastião primeiro
Num lençol amortalhado
Voltou no seu veleiro
No nevoeiro
Esperado primeiro
E depois desesperado
Onde vais ó caminheiro
Com o teu passo apressado
Que traz ó caminheiro
Esse príncipe encantado
Vou ao cais do terreiro
Ver o rei Sebastião primeiro
À tanto tempo esperado
Voltou no seu veleiro
No nevoeiro
Sem glória nem dinheiro
Num lençol amortalhado
Onde vais ó caminheiro
Com o teu passo apressado
Era príncipe ou sendeiro
Sebastião o desejado
Vou ao cais do terreiro
Ver o rei Sebastião primeiro
Num lençol amortalhado
Era príncipe herdeiro
Nevoeiro
O príncipe agoireiro
o príncipe mal esperado
Onde vais ó caminheiro
Com o teu passo apressado
Porque paras caminheiro
Se é Sebastião finado
Voltou no seu veleiro
No nevoeiro
Sem leme nem gageiro
Num lençol amortalhado
Vou ao cais do terreiro,
Nevoeiro,
Pra ficar bem certeiro
De que é morto e enterrado


NHÁ JANSA
Dom, dom dom...

Dom, Dom, Dom, Dom, Dom,
Dom, Dom, Dom, Dom Sebastião!

Dom, Dom, Dom, Dom, Dom,
Dom, Dom, Dom, Dom Sebastião!

Dom, Dom, Dom, Dom, Dom,
Dom, Dom, Dom, Dom Sebastião!

É o touro encantado (Lá dos Lençóis!)
O touro negro de luz (De assombração!)
Ferindo a testa do touro vem a baixo o Maranhão!

Esse touro é o bicho (é o bicho é o bicho..)
Esse rei é o bicho (é o bicho é o bicho..)
O touro negro é o bicho, é o bicho, é o bicho..

* Nhá Jansa

Nhá Jansa chegou
E desimbestou
Na boca do povo
O fogo assombrou
O vento virou
O bicho pegou
Até a Donana se apavorou

Credo-cruz, vixe-maria
Quem tem medo se arrepia
Com as histórias da vigia

É carruagem meu bem
Na lua cheia também
É Ana Jansen neném
Virando bicho também
Não é do mal, nem do bem
Não é real, nem vintém
É visagem, é visagem, é visagem.

Huckleberry Friend disse...

Bela colectânea... só conhecia os dois primeiros. Figura curiosa, este nosso rei, cujo olhar de menino creio ter sido muito bem captado por Cutileiro na estátua de Lagos. Beijinhos!

miguel disse...

Chegado de Barcelona , a caminho do Baleal, há sempre um tempo obrigatório para repousar nos excelentes blogues dos amigos.

abraço

Mário disse...

Huck: outros haverá. Vou ver se descubro. Dom Sebastião temn um significado muito especial. Sendo incontornável, dadas as consequências, e não sendo tão "antigo" que se possa ignorar historicamente, havia que dar a volta, porque ninguém pode, em prol da saúde mental, ter na família ou no grupo um tamanho "flop".
Foi por isso que se arranjou a desculpa: ele não foi parvo. Foi até tão esperto que se escondeu e como era tão bom está na reserva para quando isto bater mesmo no fundo. Ou seja, ainda mais providencial que o António Borges ou o António Vitorino!

Miguel: sempre bem-vindo. Foste aos Quatro-Gatos? Se não foste, volta para Barcelona, Homem! Tenho saudades, sabias?