sábado, 20 de fevereiro de 2010

25 anos: muito ou pouco?

A evolução tecnológica e comunicacional, que nos envolve e arrasta, é de tal forma vertiginosa que nos esquecemos do facto de a realidade social se transformar a uma velocidade quase "de caracol".

Vem isto a propósito de fazer hoje 25 anos que a Irlanda, através do seu governo, aprovou a venda de contraceptivos, no que constituíu a primeira derrota legislativa da Igreja Católica em toda a história irlandesa, e isto apesar de ser proibida a publicidade a estes produtos, e a própria venda ser objecto de múltiplos entraves..

Olhado de 2010, parece quase anedótico ou inacreditável. Apenas 25 anos. Ou, de outra forma, a actual realidade, se fosse agora vista por alguém ainda em 1985, não entraria sequer no delírio mais fantasioso da ficção científica.

Talvez por isso, as querelas que nos ocupam espaço, tempo e energia, serão relativizadas e remetidas para o seu devido lugar, só que - esperemos! - num intervalo muito curto de tempo. A dinâmica social é, felizmente, uma segurança perante os que querem moldar a sociedade à sua maneira, impondo a sua razão ou razões, de um modo que extravasa os seus direitos e prerrogativas.

Curiosamente, há hoje uma manifestação em Lisboa "a favor da família" - por muito dúbio que isto seja... realmente, o que é uma família? Alguém se atreve a definir? Ainda por cima, é chamada à colação a "família tradicional" - os promotores esquecem-se que esta será a família que, durante centenas de milhar de anos formatou as sociedades: a família alargada, neolítica, com um pater familiae duro e ausente, uma mãe matriarcal alimentando o "fogo", múltiplas relações extra-conjugais mantidas em silêncio, desigualdade de direitos e deveres entre os diversos membros, crianças olhadas como seres destituídos de direitos e de sentimentos, e legitimação da violência doméstica, e até dos crimes "em defesa da honra". Estes são alguns dos paradigmas da "família tradicional" - por mim, recuso-os, e ainda bem que a Família se mostra em diversas formas, todas elas com virtudes e defeitos, mas reveladoras da força, pujança e futuro desta instituição.

2 comentários:

miguel disse...

Subscrevo o texto do Mário.

Compreendo que a Igreja se sinta na obrigação de lutar pela sobrevivência de um paradigma, profundamente belo mas nem por isso menos idealizado.

Fala-se em divórcio e "aqui del-rey", esquecendo-se o facto de que a separação antecede o divórcio ,naquilo que ela significa de desamor; tédio; desrespeito; infidelidade e imaturidade , também.

Defende-se , hoje, o celibato em oposição ao casamento " sem certezas" e , nessa tarefa, a Igreja destaca conselheiros leigos, eventualmente para que se reduza o número dos divórcios " do diabo". Esquece-se que os matrimónos falhados são relativamente frequentes ( sempre foram ) dentro da comunidade eclesial e que as razões invocadas ou omitidas estão em linha com aquilo que conduz à destruição de outros matrimónios ( como se existissem matrimónios tão diferentes assim)

Parece-me que a maioria das uniões se iniciam por um espécie de determinismo , repetido desde tempos bem remotos, e corresponde a uma necessidade donde a sexualidade e o instinto de reprodução não estão ausentes, com outras razões bem mais " socializadas" à mistura. Não fôra assim e não assistiríamos a essa história repetida que é a "busca " dos adolescentes e jovens adultos , esse jogo belo mas previsível e o emparelhamento definitivo ,pouco tempo depois, rumo ao instituto do matrimónio que não acaba mais, mesmo que com outras roupagens. Daí para a frente é outro jogo, complicado também mas geralmente menos belo e excitante: uma corrida, nem sempre ganha, contra o tempo, em busca da felicidade do "eu" que se sobrepõe ao "outro".

miguel disse...

...falei de matrimónio, não de família. Mas aquele antecede a criação desta, como é dos canones.