quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

ao Pedro, pelos seus trinta anos.

Poema ao Filho


Jorge Reis-Sá


Cresceste tanto que deixaste os meus braços para trás.
Dantes, chamavas e eu ia levantar-te do berço, preocupado
com o teu choro.
Deixava-a a dormir e dava-me todo a ti.
Tu, nos meus braços, deitado e tão pequeno, abraçavas-te
muito à minha preocupação. Dizias baixinho: vamos ouvir
música, quero dançar contigo até que os demónios da noite
sejam longe. E eu ia.


Ia tanto como nunca, eu que nunca dancei para ninguém.
Ligava a música, colocava-a baixinho, tão baixinho que só nós sentíamos o seu som
: A rare and blistering sun shines down on Grace Cathedral Park, e dançávamos.

Ao som da música eu era o Pai, ao som da
música tu eras o Filho.
Dançávamos como dois anjos, sabes?, mas isso não te digo porque é muito expressivo e fica mal no Poema.
Dançávamos heróis, é mais bonito. Eu era o teu herói, aquele que te abraçava o corpo pequeno, muito nu e encostado a mim. Tu eras o meu herói, as mãos jovens ainda
te seguravam com a força toda do mundo.
Podem dizer que dançarias com qualquer um que te levantasse do berço e te sossegasse o sono.


Mas não. Quem diz isso nunca foi teu pai e nunca te sentiu filho.
Nós éramos um só, um lugar-comum, eu sei, mas éramos.
Eu apenas contigo nos braços, minha única roupa, meu único conforto, minha única protecção.
Tu embrulhado em mim pela tua pequena pele, inseguro e tímido.


E a noite, a longuíssima noite, eterna noite que eu desejava nunca terminada.
O céu no seu lugar devido,
a terra no seu lugar devido, e nós, nós os dois no lugar que devemos para sempre um ao outro: um no outro, um para o outro como duas peças de um jogo universal.



Agora, filho, agora cresceste e saíste dos meus braços.
Terás um dia alguém que te embale o sono como eu embalei, mas
nunca este amor que nasceu comigo e desabrochou contigo,
nunca este amor que só eu, teu pai, posso oferecer ao longo da noite.






Quadros:
1 -Pai com filhos - Antigo Egipto
2 -Hermes com o bebé Dionisius - Praxiteles
3 -Homem com filho - Salvador Dali
4 -Pai com filho - Vladimir Bourrec
5 -Pai - Lindsay Dawson
6- Pai e filho - Glory Wolfe
7- Pai - Charles White

12 comentários:

Anónimo disse...

Parabéns ao filho Pedro e ao pai Mário.

Este poema é perfeito para declamar a um filha que faz hoje 18anos, e que está nos EUA a estudar.
Será que lhe posso mudar o género? Se a pintura de Lindsay Dawson fosse uma mãe com uma filha ao colo, com o mar...que tanto gostamos as duas, era o quadro ideal! Mas assim é lindo à mesma!

Obrigada pela partilha

Huckleberry Friend disse...

Muito obrigado ;)
Beijos e até logo!

miguel disse...

Parabéns ao Pai, Mãe, Irmã e demais família.Um filho como o Pedro não deixa nos " braços para trás", deixa-os num repouso sereno, satisfeito.

Virginia disse...

Deve ser maravilhoso ler algo como o que está acima, escrito para nós por um Pai.Há muito que se escreve sobre o amor das Mães, mas os Pais são eternamente esquecidos - sobretudo os que o são
na realidade.

Parabéns Pedro, estava em Chaves quando tu nasceste, a 500km de Lx, mas lembro-me duma carta que a Avó Gina me escreveu a anunciar-te e ainda tenho guardada.

Que continues a ser um farol luminoso para os teus mais próximos e uma luzinha cintilante para nós, que estamos mais longe.

Até sábado.

Virgínia

Anónimo disse...

Fiquei simplesmente com pele de galinha com este poema. Achei-o simplesmente fenomenal. Sou mãe há 3 anos e às vezes quando embalo as minhas filhas só queria que o tempo parasse por um intante. Obrigada por estes poemas. Obrigada por nos levar um pouco mais longe e de nos recordar o que verdadeiramente é importante na vida. Obrigada Sr. Dr. Mário Cordeiro.

Joana (mãe da Carminho e da Caetana)

Anónimo disse...

Parabéns, Pedro! Força!

O poema é muito belo e comovente. Também repleto de ternura.
Os quadros são óptimos. Gosto principalmente do 3 e 5 (Dali e Dawson).

P.S. - No quadro de Dali, lá atrás está a Mãe, certo?

sw disse...

Parabéns Dr. Mário, pelos 30 anos do seu filho.

Também eu adorei ler este poema, tão magnífico... mais agora, que neste momento da minha vida me encontro a fazer pesquisa sobre a dramática e opressiva história das crianças no Ocidente (cf. por ex. L. de Mause: 1974).
Estas palavras foram pois uma lufada de ar fresco, pela brandura e suavidade, que ao contrário de as porem “no seu lugar”, louvam as crianças. Adorei!

Deve ser maravilhoso para um filho lê-las, quando lhe são tão especialmente dedicadas…

É possível que me apanhem hoje a dançar com o meu bebé já de 5 anos, o David.

Mário disse...

Muito obrigado.
Sabe bem ter um filho destes. E dos outros, também. Mas hoje foi ele a estrela.
Huck: não fiques com o ego desmesurado... se não, terei que contar aqui algumas das tuas birras...

Anónimo disse...

Os afectos são eternos e tenham os nossos filhos 3 ou 30 anos, são sempre os nossos meninos.
O amor que partilha com o Pedro é o mesmo que partilha com o Eduardo, simplesmente foi pai em etapas da vida diferentes.Quem vai "lucrar" mais? Não sei!! Como diz o poeta "Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades"
Ser pai é intemporal

Anónimo disse...

Parabéns a ambos.
Como é bom ver os nossos filhos crescerem!!

Pintarriscos disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Pintarriscos disse...

Tenho de fazer uma confissão ... por vezes, entre os quartos desarrumados, os ralhetes,o caos do fim do dia e os castigos, esqueço-me um pouco da magia que é ser PAI. No entanto, muitas vezes ao longo do dia, o universo faz questão de me lembrar de cada partícula de energia que foi gerada pelo tsunami de sentimentos que me atingiu no momento em que os meus filhos nasceram, em que disseram as suas primeiras palavras, em que deram os seus primeiros passos, em que chamaram pelo papá ao meio da noite, em que me ofereceram o primeiro beijo...

Este poema foi um desses momentos.

Um muito obrigado por mais uma epifania

Paulo Galindro

PS: Parabém ao pai e ao filho por esta importante data.