Sempre gostei particularmente deste quadro de Van Gogh, intitulado "Os primeiros passos".
Apesar de só em meados do século XX se terem compreendido as relações da criança com o pai e a mãe, e mais recentemente o papel na ousadia e na regressão que ambos representam, Van Gogh expressa neste quadro todo o conhecimento empírico do que a Ciência se encarregaria de demonstrar, muitas décadas depois: a criança, no final do primeiro ano de vida, passa do "pólo mãe" para o "pólo pai". Com a alegria e atitude receptiva do segundo (reparem no pormenor do pai se colocar de cócoras, à altura dos olhos da criança), com a mágoa e o sentimento de perda da primeira (tão bem simbolizado no gesto fatalista de a largar). E com o entusiasmo da própria criança, que estende os braços à autonomia e ao risco, estruturada que já está na segurança.
É um quadro admirável, que explica numa imagem o que vemos e passamos no dia a dia. As tristezas, os lutos, a sensação de "pré-reforma" das mães. O re-encontro, a felicidade, o entusiasmo dos pais.
"Corre!". "Cuidado!" - quem diz o quê? Mais importante é que ela aprende a "correr com cuidado". Van Gogh sabia...
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7 comentários:
"É um quadro admirável, que explica numa imagem o que vemos e passamos no dia a dia. As tristezas, os lutos, a sensação de "pré-reforma" das mães. O re-encontro, a felicidade, o entusiasmo dos pais."
Embora ,na minha opinião, a atitude desta mãe que está na pintura não espelhe exactamente aquilo que escreveste e eu transcrevi ( ela parece-me receptiva à atitude e chamamento do pai, demonstrando apenas alguns cuidados ao largar a criança - não vá a pequena cair )devo dizer que compreendo bem esta dicotomia mãe/pai. E o quadro é belíssimo. Ora ,acontece que vi em Madrid uma exposição sobre as últimas obras do Van Gogh. Vi em Paris outros quadros dele. E nunca vi este, com o qual fiquei fascinado. Em que museu está?
Miguel
O quadro está no Metropolitan Museum of Art, em Nova Iorque.
Se reparares, a mãe olha para baixo, e a sua atitude corporal é de retraimento, ao contrário da da criança (e da do pai).
Sabendo o que "vai naquelas cabecinhas", é admirável como Van Gogh apanhou, com uma sublime discrição, o contexto psicológico.
Adoro este quadro, e uso-o muitas vezes nas consultas dos 6-9 meses.
Abraços
"First Steps" - 1890 - está no
Metropolitan Museum of Art em New York
Quando estava a dar de mamar ao meu filho e o meu marido chegava, bastava que dissesse um "olá!" e acabava-se o jantar! O Diogo virava a cabeça e não havia voz mansinha, toques na bochecha ou desaparecimentos mágicos do papá que o fizessem voltar! Só sossegava no colo dele...
Eu ficava assim, num misto "cresce amor, mas devagar..."
Lindo quadro, pai, não conhecia... e interessante a leitura do mesmo, embora, pelos vistos, não consensual. É o que a arte e a vida têm de riqueza, não é? Um abraço a todos!
Caro huckleberry friend,
A resposta a este teu comentário creio que só poder ser: TOUCHÉ.
Vamos a ver se ela vem...
Abraço para ti do Manel
Deconhecia também este quadro de Van Gogh e não posso deixar de o achar também "admirável": quanto à sua beleza e simbolismo Pedro, as opiniões penso que são consensuais.... Quanto ao "contexto psicológico do mesmo", já a leitura me parece bastante subjectiva: aí e apesar da postura de retraimento e o olhar da mãe para baixo a que o Mário se refere, conotando-a como um sentimento de perda e uma certa mágoa, é uma leitura com a qual concordo se pensarmos que Van Gogh o pintou, referindo-se à primeira experiência de maternidade vivida por uma mãe. Agora quando vem o 2º, 3º e chegamos ao quarto filho, como é o meu caso, desejamos que essa passagem do "polo Pai" para o "Polo mâe" se faça, se possível, antes do primeiro ano de vida: qual mágoa, qual sentimento de perda... Aí concordo com o Miguel: mãe é receptiva ao chamamento demonstrando SEMPRE alguns cuidados. É que nesta idade Dr. Mário(18 meses), todos os cuidados são poucos...!!!
Bjs Milene
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